Deserto >> O Provocante início de Guilherme Weber

Deserto >> O Provocante início de Guilherme Weber

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A estréia do ator  na direção mistura o tom teatral com um cinema independente e questionador.

Foi o Reserva Cultural, um importante ponto para o cinema independente em São Paulo, que marcou a estréia de “Deserto”, o primeiro filme de Guilherme Weber como diretor.

O ator, conhecido de várias novelas (incluindo a contemporânea “Pega-Pega”, da Globo) e de filmes como “Olga”, “Meu Amigo Hindu”, comandou um longa-metragem passado inteiro no sertão do Brasil. Gravado no interior de Pernambuco, Weber comandou o elenco de oito atores. Deles, o mais conhecido do grande público é Lima Duarte, mas que traz com ele nomes talentosos, incluindo artistas de renome no teatro do Brasil: Cida Moreira, Cláudio Castro, Everaldo Pontes, Márcio Rosário, Fernando Teixeira, Magali Biff e Pietra Pan.

 

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O filme

Livremente baseado na obra “Santa Maria do circo”, do mexicano David Toscana,  “Deserto” mostra uma trupe de artistas itinerantes pelo sertão do Brasil, andando de cidade em cidade atrás de um público quase inexistente. O conjunto chega à um vilarejo abandonado, aparentemente deixado para trás, e decide criar raízes ali, formando uma cidade só deles.

Esse pretexto de formar um lugar para deixarem de ser ermitões os faz tirar sorte sobre seus papéis para a cidade: Selecionado por sorteio, cada um assume seu personagem naquela situação: De cozinheira à médica, de padre à prostituta.

 

E aí está o desafio da história: A cidade vira o palco para aqueles artistas e sua platéia seriam eles mesmos. À medida que se desenrola o roteiro, os artistas vão encarnando mais e mais seus personagens, e acabam por expor seus lados-negros, além das das misérias que  julgam interpretar, eles acabam expondo as próprias.

O filme carrega em sua estética um quê de teatro transposto para o cinema brasileiro, combinando-os de maneira curiosa: Os diálogos e ações de cada personagem remetem à uma peça ensaiada, enquanto as montagens nos remetem à um estilo de cinema bem visto nos longa-metragens das décadas de 70 e 80.  A fotografia e o enquadramento assinados pelo português Rui Poças merecem destaque, seja na simplicidade que mostrou, seja na capacidade de formar belos quadros por vezes só com silhuetas à luz da lua. E, por fim, a participação de Lima Duarte, um ator que tem toda sua carreira provando como consegue encantar pessoas e abrilhantar espetáculos. Aqui, ele faz uma participação que não é longa, mas essencial para “abrir caminho” ao público e deixar-nos conhecer os outro sete membros daquele grupo. Seu monólogo de despedida do filme, com voz rasgada emocionada, faz de sua participação algo que só ali, já valeu a experiência.

A mesma estética de filme quase marginal de décadas passadas também faz de “Deserto” um longa difícil. Definitivamente, “não é um filme pra qualquer um”. O mais tranquilo dos espectadores pode sentir-se incomodado com a necessidade de chocar de algumas das cenas, que cabiam muito bem em tempos atrás, mas que hoje o fazem um filme para nichos. As críticas sociais são abertas, mas as referências artísticas são para alguns. Esse jogo de provocações atinge seu objetivo, mas também deixa alguns “pra quê” ao invés de “por quê” em alguns momentos.

No fim, “Deserto” abre as portas para Weber no cinema como diretor. Provoca, choca, mas passa sua mensagem, e deixa também seu recado para a classe artística. Afinal, como diria Milton Nascimento, “todo artista tem que ir onde o povo está”.

 

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